Sexta-feira, 23 de Outubro de 2009

Sr. ÁLVARO SANTOS PEREIRA

1924-2009

 

"Dos 17 aos 23 anos

Cá com as minhas cantigas

Consegui arranjar namoro

Com várias raparigas"

 

 

Álvaro Santos Pereira mais conhecido por "Mata Ratos", uma alcunha aceite por ele enquanto vivo, apagou-se e foi enterrado hoje.

Uma figura crismática de Rio de Moinhos que ficará a jamais nos corações dos riomoinhenses.

Um bom Homem, sempre bem disposto e que gostava de animar a malta.

Era também conhecido pelas suas prosas e versos dedicados as pessoas e aos acontecimentos da terra.

Vamos ter saudades da sua boa disposição.

Para os seus familiares directos nomeadamente à sua esposa, as minhas sinceras e sentidas condolências.

Fica aqui um dos últimos poemas escrito por ele que retratam a sua vida.

No ano de 2005, pedi ao Sr. Álvaro Pereira que me fizesse um resumo da sua vida em versos. O que ele fez com muito gosto.

Para que ficasse a jamais gravada nas memórias dos riomoinhenses, fica aqui a sua auto-biografia.

Para os cibernautas e em respeito à sua memória ... 

 

I

Comecei a trabalhar aos 12 anos

Trabalhei até aos 68

Mas aqui tive que parar

Senão ficava feito num oito

 

II

Agora vou descrever

Porque penso nisso a rodo

Como foi o meu trabalho

Durante este tempo todo

 

III

Comecei a trabalhar

E reparem com atenção

A trabalhar numa fábrica

Que era a serração do Covão

 

IV

Andei a aprender a sapateiro

Lembro-me muito bem agora

Mas aquilo não dava nada

E eu safei-me de lá para fora

 

V

Foi na sapataria do saudoso “Calcinhas”

Mas isso agora não importa

Trabalhava lá o falecido “Fama”

E o Luís Canhoto

 

VI

Aos 17 anos fui para Alferrarede

Lembro-me disto muitas vezes

E reparem que trabalhei lá

Cinquenta anos e nove meses

 

VII

Andei três anos a pé

O que já foi demais

16 anos de motorizada

E 31 de bicicleta a pedais

 

VIII

Lembro-me que um dia de bicicleta a pedais

Mesmo a chegar ao quartel

Formou-se um forte temporal

Que me entornou o farnel

  

IX

Foi um forte temporal

Que não tinha nada de arrevesas

Eu ia com o guarda-chuva aberto

E voltou-me das avessas

 

X

Nesse tempo ainda não havia

Os tais fatos de oleado

E eu chegava a Alferrarede

Num pinguinho todo molhado

 

XI

No verão ainda escapava

Era melhor para a rapaziada

Porque atalhávamos por S. Lourenço

E comíamos frutos à beira da estrada

´

XII

Mas um dia apareceu o dono

A gente começou-se a rir

Ele agarrou num grande pau

E nós tivemos que fugir

 

XIII

E foi assim que foi a minha vida

No que diz respeito ao trabalho

Lembro-me bem de tudo isto

E tenho a certeza que não falho

 

XIV

Mudando agora de assunto

Porque isso ainda hoje está na moda

Nós quando somos novos

Andamos com a cabeça a roda

 

XV

Eu quando era novo

Andava de pés em bicos

Só para ver se conseguia

Arranjar namoricos

 

XVI

Dos 17 aos 23 anos

Cá com as minhas cantigas

Consegui arranjar namoro

Com várias raparigas 

 

XVII

Não namorei muitas nem poucas

Arranjei assim assim

Quando me aborrecia largava-as

E algumas largavam-me a mim

 

XVIII

E assim se passou o tempo

Da minha mocidade

Que ainda hoje recordo

Com muita e muita saudade

 

XIX

Saudades todos temos

Dos nossos tempos de novinhos

E para mais agora

Quando já vamos para velhinhos

 

XX

Nasci em 1924

Tenho 80 anos de idade

E agora em muitos casos

Já nos vai faltando a vontade

 

XXI

Aos 13 anos de idade

Já tinha uma namorada

Eram coisas de cachopos

Que agora não interessa nada

 

XXII

Ganhava 16 tostões por dia

Era um ordenado dos tais

Minha saudosa mãe dava-me cinco tostões

Ao Domingo pois não podia dar mais

 

XXIII

Num dia fui com ela para a feira

Mas com um medo tamanho

Como não tinha dinheiro na carteira

Escondi-me na casa de banho

 

XXIV

No dia seguinte falamos

E ela disse: “deste-me um desgosto”

E eu respondi: “que me vim embora

Porque estava mal disposto”

 

XXV

Quando estava na escola para a 4ª classe

O meu professor dizia-me que eu era inteligente

E eu como ouvia aquilo

Ficava feliz e contente

 

XXVI

Depois fomos a exame

Numa manhã de verão

E ainda me recordo

Que apanhei uma distinção

 

XXVII

Fiz então o meu exame

E para que isso não bastasse

Como não havia dinheiro

Fiquei apenas com a 4ª classe

 

XXVIII

Quando o dinheiro é poucochinho

Isso também não convém

Pois cada qual tem que se governar

Só com aquilo que tem

 

XXIX

É que se eu tivesse dinheiro

Como há para aí alguns que estão fartos

Eu tinha entrado na faculdade

E hoje era o Dr. Mata Ratos

 

XXX

Fui presidente e tesoureiro

Da nossa Casa do Povo

E mais tarde passei a continuo

Cá do nosso povo

 

XXXI

Dos meus colegas de exame

Por destino está tudo moribundo

E só eu graças a Deus

É que ainda estou neste mundo

 

XXXII

Nasci e vivo em Rio de Moinhos

Que fica à beirinha do Tejo

Antigamente até lhe chamavam

A Sintra do Ribatejo

 

XXXIII

Mas embora nos custe muito

Temos que dizer a verdade

Como Rio de Moinhos era dantes

Hoje é apenas uma saudade

 

XXXIV

Ensaiava marchas de Carnaval

Umas menos outras mais capazes

Mas normalmente só ensaiava

Eram marchas com rapazes

 

XXXV

Ensaiávamos com força e alegria

As várias terras fomos com vontade

Lembramo-nos com muita pena

E disso temos muita saudade

 

XXXVI

Pediram-me para fazer isto

O que fiz com vontade e afinco

Agora termino desejando a todos

Um bom ano de 2005    

 

Que Deus o tenha em um bom lugar e que proporcione conforto a família neste momento tão difícil.

 

publicado por riodemoinhos às 22:00
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1 comentário:
De Ana Paula a 30 de Outubro de 2009 às 00:46
Apesar de não ter privado com o poeta "Mata-ratos" tive a oportunidade e o prazer de o ouvir retratar as gentes e os hábitos da sua Terra sob a forma de quadras populares. O genuíno poeta popular.
Resta o conforto de uma vida preenchida.

A toda a familia, palavras de coragem e animo .
APF

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